El Habitante Incierto / The Uninvited Guest
2004 / Espanha / 90 min / Direção: Guillem Morales / Roteiro: Guillem Morales / Produção: Joaquín Padró, Mar Targarona / Elenco: Andoni Gracia, Mónica López, Francesc Garrido, Agustí Villaronga, Minnie Marx
O cinema espanhol sempre é digno de nota, principalmente, tratando-se dos gêneros terror, suspense e fantástico, ainda com a guinada de suas produções a partir da década passada. El Habitante Incierto, filme desprezado de acordo por nossas “ótimas” distribuidoras brasileiras, é um desses mais felizes exemplos.
Suspense com S maiúsculo, o longa do diretor Guillem Morales evoca todos os ensinamentos de Alfred Hitchcock e Roman Polansky para apresentar uma trama simples que mistura paranoia, claustrofobia e voyeurismo, executada de forma perfeita, em suas duas metades completamente distintas, até seu desfecho pessimista soco no estômago.
Félix, interpretado por Andoni Gracia é um arquiteto que se separou de sua mulher, Vera (Mónica López) e mora sozinho em uma grade casa, projetada por ele, repleta de cômodos. Desde então, o sujeito já vive certo clima de solidão, tristeza e paranoia por ficar sozinho naquele local tão grande. Até que certa noite, um estranho bate em sua porta, pedindo para usar o telefone, pois a cabine em frente a residência não está funcionando.
Félix aceita ajudar o sujeito, e no curto espaço de tempo que ele vai até a cozinha e volta, ele desapareceu. Esse é o gancho para que Félix tenha a certeza absoluta que o estranho continua dentro de sua casa, se esgueirando por cantos escuros, cômodos, porão, sótão e todos os locais, espionando a sua vida, o que vai fazer com que ele vá as raias da loucura e fique completamente paranoico, a ponto de chegar até a machucar fisicamente Vera com uma faca.

Essa é a primeira metade do filme, que vai sendo levada num suspense crescente, daqueles tensos de roer as unhas. Certa noite, Félix acaba alvejando o habitante incerto com um tiro, e deixa-o trancado na sua casa, fugindo do local. Por um golpe de sorte (daqueles enfiados milimetricamente no roteiro de forma tosca) ele descobre onde o sujeito mora, após fazer um retrato falado do mesmo, e resolve invadir a sua casa.
Lá ele descobre que ele se chamava Martín e era casado com uma paraplégica, Claudia (também interpretada por López), paralisada da cintura para baixo e que se locomove por meio de uma cadeira de rodas. Esse é o momento que o filme da uma guinada em 360º e Félix passa então a fazer a vez do habitante incerto, se esgueirando pela casa de Claudia, observando-a em diversas situações, mudando inclusive o tom do longa, mais puxado para a comédia e o drama.
Morales foi indicado ao Goya na categoria Melhor Novo Diretor, com todas as honras, uma vez sua direção é precisa, prende a atenção do espectador, trabalhando muito bem o suspense, enquanto escancara a angustia de Félix, tanto pela situação desconcertante e paranoica como pela sua relação com a ex-esposa, travando uma feroz batalha contra a sanidade, com os elementos de comédia de situação e o drama, mesmo sujeito aos furos de roteiros e escorregadas em sua parte final.
O grande lance de El Habitante Incierto é essa inversão de valores, de por que diabos que Félix, que já estava bem pirado das ideias e que viveu na pele essa estranha sensação de perseguição, voyeurismo e desconforto, resolveu experimentar a experiência, chegando a desenvolver até uma relação rotineira com Claudia e se apaixonar por ela, até seus momentos finais, onde mais uma vez o nível de adrenalina sobe e teremos uma daquelas revelações que vai te deixar de queixo caído, espantado ou provocar uma risada nervosa (que foi meu caso).

